Vitória arregalou os olhos, não cabendo em si de contentamento. E se coubesse, a alegria nem caberia na alegria e subiria faceira, indo fazer rir as nuvens.
O jardim da casa nova era uma novidade nunca vista antes por ela. O apartamento pequeno, com vista para outros prédios, a fizera pensar que pessoas nascessem em blocos, flores só crescessem em vasos, pássaros vivessem apenas em gaiolas, gatos e cachorros morassem em sofás e tapetes e ... eventualmente em sua cama.
Na pracinha onde costumava brincar, as flores viviam em grandes vasos de cimento. Agora, com as mãozinhas na boca de puro espanto, descobria que elas também nasciam do chão, direto da terra e cercada pela grama verdinha e fofa.
Os pais, zelosos com a saúde da filha, resolveram comprar uma casa, pois queriam que ela tivesse contato com a natureza. Vitória apresentara sintomas alérgicos e o ar fresco iria lhe fazer bem - recomendações médicas - que trataram de seguir.
Dando pulinhos, a menina explorou o terreno, gritando o tempo todo "olha! olha!". Com os pezinhos descalços, correu pela grama, tocando nas plantas e exclamando para os pais "como o pátio novo tinha um cheirinho bom".
Para completar a alegria da filha, os pais montaram uma pequena barraca no jardim, para que Vitória pudesse brincar e se proteger do sol. Cansada com tantas novidades, a menina deitou e dormiu em seguida, com o rostinho corado e feliz. Então, sentiu algo subindo pelo braço, causando-lhe cócegas. Abriu os olhos e viu uma joaninha. A coisa mais linda que já vira. Que bichinho seria aquele? Não sentiu medinho. Amou a criaturinha. Colocou-a nas mãos. Alisou. Contou-lhe historinhas. Conversou bastante com a pequenina visitante, revelando-lhe todas as lembranças que seus três anos de memória foram capazes. Exausta, adormeceu, esquecendo a joaninha, que ficou passeando dentro da barraca.
Quando acordou, já estava de pijama, deitada em sua cama. Era uma daquelas mágicas que amava mais que tudo. Quando dormia estava num lugar, quando acordava estava em outro. E os pais sempre por perto.
No dia seguinte, foi para o jardim brincar. Esperou pela joaninha, que naquele dia não apareceu. Contou para a mãe sobre o bichinho que parecia uma bolinha. A mãe riu muito e explicou para Vitória tudo o que sabia sobre joaninhas.
Os dias correram. A menina cresceu. E como é próprio da vida, os momentos vividos vão ficando para trás, sem nunca terem saído de dentro.
Tornou-se uma linda jovem e bióloga dedicada. Adquiriu um gosto inexplicável por joaninhas. Não sabe dizer a origem de sua afeição, mas sempre que encontra algum objeto com formato do bichinho, fica admirando, fascinada. Já comprou adesivos para seu notebook, mouse, pen drive, agendas, estojos, cadernos e vários utensílios com o tema. Seu atual sonho de consumo é um celular japonês, com designer imitando uma joaninha.
E quando, por curiosidade, perguntam a ela o motivo desta sua preferência, ela encolhe os ombros e responde:
- Sei lá. Gosto é gosto!
Rosa Mattos